quarta-feira, 31 de março de 2010

Lembranças

Fotografia: Suria L.
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Vim dali, bem pequenino.
A mesma árvore, só que enorme.
Vim dali, e o mesmo fim de tarde.
E agora que volto?
Como retornarão as lembranças?
Eu vivi ali, naquela rua.
Naquela praça com outros rebentos.
A mesma praça está vazia,
E o broto, crescido.
Eu reguei aquela árvore,
Da frente da minha casa.
Reguei com esperança,
Com a fome, e a vontade.
E agora que eu volto,
Tudo tão diferente a paisagem,
E os homens mortos,
E as mulheres solitárias.
Eu corri ali, naquela rua
Que ficava atrás da paisagem
que estou agora:
O que valerá atrás da construção velha?
O que seria se não houve a construção nova?
E a árvore intacta,
Preenche o vazio da minha lembrança
Onde havia casa.
Onde havia infância.
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(Sérgio Oliveira - 29 de março de 2010)

terça-feira, 23 de março de 2010

Céu Negro

Fotografia: Suria L.
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Tenho medo, minha senhora.
Medo das veias em tempestade.
Medo dessa linha do horizonte,
Ser a linha do coração parado.
E a pretidão que me consome,
São olhos fechados da morte.
Minha senhora, meus amigos,
perdoem-me.
Meus objetos, meus amores,
esqueçam-me.
Pois tenho medo, minha morte.
Da tempestade do horizonte;
Que jorra sangue pelos olhos,
E sofrimento pela boca.
Tenho medo de quem vem dali.
Ao longe dos nossos olhos:
São seres que criamos,
Ou que nos criaram infames?
E ao longe, nesse dia feio,
Nasce do sangue do arrependimento.
Tenho medo, minha senhora,
Que os remédios sem efeito,
Sejam tão doces e amáveis
Como a linha do horizonte, agora
Vermelho como a cura;
E culpa de um céu negro.
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(Sérgio Oliveira - 23 de março de 2010)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Assombro da Tempestade

Fotografia: Suria L.
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E o verso da foto do céu?
Inverso, nesses dias quentes.
Escarlate. Vejo escarlate.
Das ruínas do que sobrou.
O céu límpido é a reconstrução.
E as perdas e mortes,
E as dores de ontem.
Vejo escarlate, o céu.
Escarlatina da memória,
banhado de águas barrentas
que levou tudo que importava.
Vejo um céu horrível.
com meus olhos fechados,
e com os braços cansados.
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Mas, a vida pulsa; desconcertante.
Brilha céu escarlate, a pluma.
Aves que voam e nuvens que povoam.
Céu de desenhos inimagináveis.
Céu das ondas intermináveis.
Céu que de escarlate,
um passado remoto inesquecível.
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Céu limpo e vazio, azul;
um assombro da tempestade.
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(Sérgio Oliveira -22 de fevereiro de 2010)

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Visão do Mendingo na Praça

Fotografia: Suria L.
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Pessoas caminham,
decidem e se importam.
Humanos e árvores,
pássaros e a fome.
Pessoas na praça,
enamoram.
Eu solitário, as vejo:
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Como eu queria Sê-los.
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Pessoas que se importam,
amam e se apavoram.
Pessoas na praça,
caminham e enamoram.
(Não sabem fazer outra coisa
em suas vidas).
Como eu queria sê-los;
Esses pássaros solitários:
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Mas viver sem a maldita fome.
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(Sérgio Oliveira -18 de janeiro de 2010)

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Banho

Fotografia: Suria L.
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Um banho que me salva,
Da tempestade do medo.
E tira-me do rebanho,
Na relva, alimento.
Dos sonhos de eterno.
A água que me banha,
Retira-me a larva, e
Retira minhas penas.
E retira minha dor.
E tira-me ao longe,
Onde os sonhos
Transbordam.
E as nuvens revoltam
Para o seu mesmo
(único) lugar.
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(Sérgio Oliveira -25 de novembro de 2009)

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Prédio Fantasma

Fotografia: Suria L.
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Lá dentro, onde trabalho,
As pessoas choram,
as mulheres gritam.
Lá no alto, pela janela!
Os homens correndo,
Crianças choram e
As mulheres trabalham.
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Lá dentro, naquele andar,
Onde eu me tranco nos dias,
Com pesadelos da madrugada
É onde eu trabalho e não moro,
Morro, mas não amo.
No alto, pela janela.
Onde eu preso,
E os homens choram.
E as mulheres correm.
E as crianças gritam.
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Mas tudo é tão normal,
Naquela janela,
Onde todos mortos.
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(Sérgio Oliveira -16 de outubro de 2009)

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Prisão em Mim

Fotografia: Suria L.
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Lá fora a voz que me obedece:
Calem-se! Deixem-me dormir!
Aqui dentro o medo e a solidão.
Lá fora as folhas e o vento.
Esse dia de chuva que se forma.
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Aqui a folha em branco
e a chuva, permanente.
Quem de nós preso à inconstância?
Quem de nós não somos nós mesmos?
Eu aqui dentro apenas olhando
Você ai fora também obedecendo?
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Todos os insumos do tempo:
Você preso ai fora, eu aqui dentro.
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(Sérgio Oliveira – 13 de outubro de 2009)